Lá vai o Filme do Tio Mário da semana. Quem num sabe o que é um "Filme do Tio Mário", por favor leia a intro desse post.
O Cineclube de Bexiga ficava na Rua Treze de Maio, em São Paulo. A "Treze" era a meca dos bichogrilos, roqueiros, alternativos, boêmios, enfim todas as tribos tinham seu espaço nessa pequena babel cultural de São Paulo nos anos 80. Mas o principal, pelo menos prá mim, era o cineclube. Pequeno, acanhado, com somente um antigo projetor que obrigava a um intervalo forçado para troca de rolos no decorrer da sessão, foi um dos locais que me deram a chance de descobrir a Nouvelle Vague, Bergman, Neo-Realismo, etc.
O cineclube tinha um livro de visitas, onde os freqüentadores escreviam de tudo: poemas, críticas e principalmente, pedidos de filmes. O nome "Malpertuis" enchia páginas e páginas. Parece que quem tinha visto o troço nos anos 70 - aparentemente houve uma exibição do filme em alguma mostra ou ciclo especial - não esquecia. Eu, tomando meu café (é, o cineclube tinha um minúsculo coffee bar), ficava folheando este livro e morrendo de curiosidade para assistir o tal do Malpertuis (França/Bélgica/Alemanha, Harry Kümel, 1972). Numa próxima vez volto a falar do cineclube.
A oportunidade aconteceu na 9a Mostra de Cinema de São Paulo, em 1985. Lá estava ele, programado...e lá fui eu, assisti-lo. Prá início de conversa, existem diversas versões do filme. A última, restaurada pelo diretor e exibida em 2002 na Europa, é totalmente falada em flamengo, ao que parece o idioma original do filme (o diretor é belga). A que assisti no cinema, se bem me recordo, era falada em francês, com legendas em espanhol. Mas existem versões reduzidas, ampliadas, dubladas em inglês, alemão ou holandês - o que sem dúvida só contribui para aumentar o caráter cult do filme.
A trama é essa: Malpertuis é um castelo "assombrado", labiríntico e inescapável para quem o habita. Cassave (Orson Welles, excelente e completamente preguiçoso) está em seu leito de morte e deixa em testamento uma fortuna considerável para seus herdeiros, os quais devem por contrato viver até o final de seus dias em Malpertuis. Jan, um sobrinho de Cassave recém-chegado ao castelo, constata a estranheza dos tipos que compõe sua "família" - mistérios que serão revelados ao final da epopéia (aliás é um final daqueles reveladores e apoteóticos).
Os principais elementos utilizados pelo diretor são a composição surrealista e a mitologia grega, temas caraterísticos de Jean Ray (também belga, assim como o diretor Kümel), um dos melhores escritores europeus de literatura fantástica. Na minha impressão, um filme exemplar, de visual belíssimo e inventividade assombrosa, marcas do diretor Kümel, de quem depois acabei assistindo o anterior "Lábios de Sangue" (também chamado no Brasil de "As Escravas do Desejo" - Les Rouges aux Lèvres, Bélgica/França/Alemanha, 1971), também excelente e sobre...vampiras !!! Mas esse fica prá outro dia...
Uma boa notícia é que, com uma boa garimpagem, pode-se conseguir o VHS nas locadoras. Foi lançado como "Malpertuis - Estranhas Fantasias", acredito que pela Globo Vídeo. Boa sorte !!!!
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